segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Agrale Marruá na Pick-Up Racing: Uma estranha no ninho que provou o seu valor

 (Pirateado do Blog Nivelando a Engenharia)


No início dos anos 2000 a Pick-up Racing cresceu no cenário automobilístico brasileiro, reunindo picapes médias como Ford Ranger, Chevrolet S10 e Dodge Dakota, equipadas com motores V6 bi-turbo que chegaram a ser movidos por GNV entre 2002 e 2005. A partir de 2006 os motores passaram a ser alimentados por etanol, resultando em um aumento de potência de 310 para cerca de 400 cv que, em veículos que mantinham o chassi de longarinas e o esquema de suspensão original, eram garantia de emoções e boas disputas nas pistas.

Para 2007 a categoria viveu uma série de novidades: a Vicar, promotora da Stock Car passou a ser a responsável também pela Pick-up Racing, e uma quarta montadora se juntou à disputa, a gaúcha Agrale com a versão picape do veículo militar Marruá. Evolução do projeto original do jipe Engesa, o Marruá nasceu para atender as Forças Armadas brasileiras e serviços off-road pesados, e chegou à categoria por iniciativa de Franco Stedile, com preparação da equipe Gramacho Racing. 

Lado a lado é mais fácil notar as diferenças entre o Engesa EE-12 (esquerda) e o Agrale Marruá (direita).

Conceito e desenvolvimento

Sketch conceitual do Marruá de competição.

Para entender como um carro militar acabou nas pistas de corrida, primeiro devemos conhecer o piloto que tornou isso possível. O gaúcho Franco Stedile é um dos herdeiros do Grupo Francisco Stedile que, entre outras empresas, é proprietário da montadora Agrale. Por alguns anos, Franco competiu na Pick-up Racing utilizando uma picape S10, com patrocínio da Agrale, e com o lançamento do Marruá, o piloto viu na categoria uma oportunidade de promover o produto “da casa”. Ainda que o visual quadradão fosse mais adequado a uma trilha enlameada ou em um rallye todo-terreno, a equipe Gramacho Racing realizou um excepcional trabalho na montagem das duas picapes que competiram pela equipe de fábrica.

A ideia da participação da Agrale na categoria estava em processo de maturação desde 2006, porém a luz verde para o projeto veio apenas em janeiro de 2007, com apenas três meses entre o início da construção dos carros e o primeiro treino realizado em Curitiba no dia 18 de abril. Nas palavras de Alexandre Gramacho: “Foi uma oportunidade para fazer os primeiros ajustes de pista para a etapa de abertura. Trabalhamos, principalmente, no acerto da suspensão, já que as dimensões desse carro (altura, distância entre-eixos, etc) são totalmente diferentes das da S10, modelo que utilizamos no ano passado. O importante foi que não tivemos nenhum problema mecânico”.

O primeiro desafio para converter o Marruá em um carro de pista foi a motorização, visto que o utilitário era equipado apenas com motores diesel MWM. A saída encontrada foi adaptar o conjunto motopropulsor da S10 (motor Vortec 4.3 V6 e transmissão NV3500 manual de cinco marchas) sobre o chassi original da Agrale.

O pacote aerodinâmico seguia o padrão da Pick-up Racing, definido em regulamento para manter a disputa equilibrada. Na dianteira o pára-choques foi substituído por um spoiler em fibra com duas tomadas de ar para os freios dianteiros (1), e dois elementos verticais análogos (2) incluídos para gerar algum downforce na dianteira. Ainda na dianteira podemos ver os alargadores de carroceria, necessários para acomodar os pneus slick, mais largos que os utilizados nas picapes de produção em série, e que contam com aberturas (3) para ventilar as caixas de roda dianteiras. Os freios traseiros recebem ar através de uma tomada dupla (4) e o principal elemento gerador de downforce do carro é a asa traseira (5), de simples elemento e padronizada para todas as picapes.

Na traseira vemos que a caçamba recebeu cobertura rígida (6), solução prática para redução do Cd de uma picape (segundo um estudo conduzido pela SEMA em 2007, a adoção de uma cobertura de caçamba pode representar um ganho entre 5% e 8% no Cd de uma picape – fica a dica para os proprietários de picapes). As rodas traseiras também apresentam pequenas aberturas de ventilação (7) e um difusor, padrão da categoria, foi instalado na traseira (8).

Por ser predominantemente um veículo off-road do Marruá, a suspensão dianteira de eixo rígido foi modificada para as pistas, e a versão de competição foi equipada com o sistema independente de braços oscilantes original da S10, com buchas em nylon. Na traseira, foi mantido o sistema de eixo rígido conforme determinação do regulamento, com o diferencial original da S10. 

Outra adaptação necessária foi a substituição do sistema de direção original Agrale pelo sistema utilizado do Mercedes Classe A nacional. Com tantos novos componentes, a expectativa de Stédile para o Marruá era ambiciosa: desenvolver o carro e buscar a primeira vitória já na primeira temporada. Como veremos abaixo, essas expectativas foram mais do que superadas.

Histórico em competições

A versão de pista do Marruá recebeu diversas críticas quando foi apresentada, com os mais céticos acreditando que o modelo de linhas quadradas não seria capaz de fazer frente às picapes de design mais moderno. Na estréia em Tarumã, a equipe enfrentou dificuldades com o set-up da suspensão, classificando os carros nas distantes 13ª e 15ª posição do grid. Na prova as picapes gaúchas apresentaram um desempenho razoável, em Franco Stédile conseguiu se aproveitar das quebras e acidentes dos competidores para obter a quinta posição final, marcando o que foi considerado uma vitória pelo piloto gaúcho: “Fiz uma corrida tranqüila, escapando dos acidentes e preservando equipamento. Fui beneficiado pelos inúmeros abandonos e acidentes, mas o resultado serviu para mostrar o potencial do carro e da equipe (Gramacho Racing), a quem dedico essa vitória”.

Na segunda etapa, disputada em Curitiba, novamente as picapes Agrale sofreram com problemas nos treinos classificatórios. Após ter ficado entre os 5 primeiros nos treinos livres, Franco Stédile obteve apenas a 12ª posição: “Erramos no ajuste da alimentação do motor, mas o problema maior, que era o acerto de suspensão, foi resolvido”.

Na corrida o bom desempenho se confirmou em um pódio duplo, com Stédile em terceiro e Gramacho em quinto, levando a Agrale à segunda posição no campeonato de construtores e Stédile à segunda posição na classificação de pilotos, nas palavras do chefe de equipe e piloto Alexandre Gramacho: “Foi muito mais do que imaginava. Sabia que o carro estava bom, mas não tinha pretensão de chegar em quinto. Foi como um sonho subir ao pódio”.

A terceira e quarta etapas foram disputadas em formato de rodada dupla no Autódromo Internacional Nelson Piquet, em Brasília. A primeira prova, disputada no traçado misto de 5.475 metros teve um resultado desastroso para a Agrale, com as duas picapes abandonando a prova logo no início. Dessa forma a segunda prova, disputada no anel externo do circuito, já começava prejudicada pois o grid de largada foi definido pela ordem de chegada da primeira prova, com inversão dos oito primeiros. Na prova, as picapes Agrale tiveram um excelente desempenho e recuperaram diversas posições, repetindo o pódio duplo da etapa de Curitiba.

Para a quinta etapa, realizada no Autódromo Internacional Ayrton Senna em Londrina, o time de pilotos da Gramacho foi alterado com a substituição de Alexandre Gramacho por Rafael Sperafico, dando início a uma série de pilotos da Stock Car convidados para correr pela equipe. Nos treinos, o piloto paranaense mostrou a que veio e conseguiu a excelente terceira colocação, com Stedile largando em 8º após apresentar problemas durante os treinos.

Na corrida, o pole Sérgio Lúcio teve que largar dos boxes devido a um pneu furado quando se dirigia ao grid de largada e o segundo colocado, Herberto Heinen largou mal, de forma que a primeira colocação caiu no colo de Sperafico. Parecia que ia ser a primeira vitória da Agrale na categoria, mas a três voltas do fim saiu da pista deixando a vitória de bandeja para Marcel Wolfart e Franco Stedile obteve manteve a posição de largada. Nesse ponto do campeonato, os críticos do projeto já haviam sido calados, com a confirmação do bom desempenho das picapes Agrale, principalmente nas curvas de baixa e média. 

Dessa forma, a expectativa era alta para a sexta etapa, que seria disputada em Santa Cruz do Sul, um traçado que seria favorável para as características do Marruá, como destacava Franco Stédile após a prova de Londrina: “O traçado favorece o nosso carro, que tem um excelente desempenho em circuitos mais travados”.

Na etapa gaúcha competiram Franco Stedile e Renato Jader David, que obteve a segunda colocação nos treinos da sexta-feira, apenas 30 milésimos de segundo mais lento do que Herberto Heinen, enquanto Stedile sofreu novamente com problemas, dessa vez no eixo traseiro. No treino classificatório, veio a primeira pole-position pelas mãos de Renato Jader David, enquanto Stedile, ainda sofrendo com os problemas da sexta, conseguiu apenas a 12ª posição, a nove décimos do primeiro. Novamente a vitória escapou das mãos da Agrale, desta vez devido a um superaquecimento no motor da picape de Renato Jader David, mas Franco Stedile fez uma excepcional corrida de recuperação chegando em terceiro, posteriormente transformada em quinta posição devido a uma punição após um incidente com Kau Machado.

A sétima e oitava etapas, realizadas em Jacarepaguá, seriam novamente no esquema de rodada dupla adotado em Brasília, Mais uma vez a Agrale demonstrou força, agora tendo Alceu Feldmann como piloto convidado. O paranaense não decepcionou, e dominou o final de semana obtendo o melhor tempo do treino da sexta-feira e também a pole-position para a sétima etapa, com Franco Stedile largando bem próximo na quarta colocação. Na corrida, finalmente veio a primeira vitória da Agrale e Stedile, que havia obtido sua melhor colocação de largada na temporada, acabou abandonando a nove voltas do final. 

Na oitava etapa, Feldmann envolveu-se em um acidente com Aluízio Coelho, mas Franco Stedile fez uma corrida de recuperação e cruzou a linha de chegada em segundo, que se converteu em vitória devido a uma punição de 20 segundos aplicada no vencedor Marcel Wolfart.

O bom resultado embolou a disputa pelo título do campeonato de pilotos, e cinco pilotos chegaram para a última etapa em Interlagos com chances matemáticas de título, incluindo Franco Stedile. Para esta etapa, o piloto convidado da Agrale foi Wagner Ebrahim, que conseguiu a terceira colocação no grid de largada, enquanto Stedile ficou com a sétima posição. Na corrida, Ebrahim obteve na quarta colocação, enquanto Stedile ficou em um distante 11º posto. Apesar de não ter levado o título de pilotos ou de construtores, a equipe Gramacho/Agrale alcançou o objetivo estabelecido no início do projeto de vencer na temporada de estreia. 

Com a aquisição da Pick-up Racing pela Vicar no fim de 2007, o regulamento da competição mudou para um modelo semelhante ao da Stock Car, deixando-se de lado as picapes modificadas e adotando uma estrutura tubular com padronização de câmbio, motor e suspensão e uma carroceria lembrando os modelos de rua, as famosas bolhas. Provavelmente devido a essas mudanças, o interesse da Agrale em competição desapareceu, porém esse não seria o fim da história do Marruá nas pistas.

Com a mudança de regulamento na Pick-up Racing, as picapes antigas simplesmente tornaram-se obsoletas e muitas foram simplesmente aposentadas. Contudo, alguns pilotos viram na Classe II do Campeonato Gaúcho de Endurance uma oportunidade de continuar em atividade, ao ponto que o vice-campeão da Pick-up Racing em 2007, Eduardo Heinen, sagrou-se campeão gaúcho de Endurance na Classe II no ano de 2008. Franco Stédile foi outro a se aventurar no Endurance a bordo do Marruá durante a temporada 2008, incluindo uma participação nas 3 Horas de Santa Cruz do Sul, válida pelos campeonatos gaúcho e brasileiro da modalidade.

Short SRT - Ainda uma boa ideia, em especial para "club tracks".

O Short SRT faz jus ao nome. Sua trajetória é semelhante à do Aldee GT.

Um carrinho esperto, com motorização conhecida por todo mecânico - O bom e velho Volks AP - e cuja relação peso-potência lembra bastante os carros peso-pena tipo Lotus Seven. O kit ainda está à venda, pois a Short Motorsport fabrica vários produtos e presta serviços relacionados ao esporte a motor, portanto o carrinho pode ser encomendado sem problemas.

Começou como uma opção barata de fora-de-série, com motor VW a ar, que depois foi trocado por um AP. A versão de corrida usa um AP 1.8 turbo. Foi cogitado, lá em 2010 de se fazer uma categoria monomarca lá no Mega Space, mas parece que não foi muito pra frente.

A plataforma também está sendo usada para uma versão elétrica, chamada "Short E", que promete ser um veículo elétrico de alto desempenho. Nas palavras da companhia: 

Levantamentos inicias para desenvolvimento de veiculo elétrico, classificação de ZERO EMISSÕES.

O projeto incorpora uma pesquisa AER, Aerodynamic energy recovery, onde se propõem recuperação de energia transformada a partir da energia potencial e efetiva incorporada do fluxo aerodinâmico.

A proposta é um veiculo de alto desempenho que utilizaria dois motores diretamente acoplados individualmente em cada roda motriz traseira.

O “cavalo” para este desenvolvimento seria baseado, para queimar etapas, no nosso SHORT SRT de competição com sensíveis modificações em seu lay-out para as novas características.

Mas, com ou sem versão elétrica, o carrinho é promissor, em especial para auto-clubes, ligas independentes e circuitos pouco utilizados. Pode-se dizer que é o GT mais barato do mundo. Por começar como carro de rua e terminar como veículo de corrida, sua trajetória se assemelha ao Aldee GT, que como carro de rua foi um fracasso, mas como carro de pista, deu canseira em muito modelo importado. E o Short parece ser ainda mais leve que o Aldee.

Mais detalhes sobre o carro, e sobre outros produtos e serviços da empresa, podem ser conferidos no site:
Short Motorsport